segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Com gente, é diferente...


O ritual se repete, porque ninguém abre uma empresa para fracassar. Depois de identificado o ramo mercadológico mais viável e estabelecida a localização que mais favoreça o negócio, inicia-se a busca de profissionais adequados ao projeto. E em tempos de penúria de empregos confiáveis, a menos que se trate de uma anacrônica fábrica de suspensórios, haverá uma enxurrada de currículos escorrendo pelo balcão dos recursos humanos.
Competência, rapidez mental, treinamento, experiência prévia, liderança, antecedentes de fidelização, relacionamento pessoal, ambição profissional são alguns dos itens esgrimidos nas entrevistas, todas tentando encontrar o funcionário ideal, comprometido e definitivo. Obviamente o selecionado para trabalhar numa máquina trituradora de lixo ou o candidato a restaurador de obras de arte não terá o mesmo perfil, posto que frequenta diferentes sites de busca.
Mas entre os extremos de rudeza e doçura circulam os que foram selecionados para trabalhar com pessoas, e desses se espera toda a flexibilidade emocional para conviver com angústia, pressa, intolerância, carência afetiva, preconceito, gentileza, deboche, estupidez, afeto, fingimento e solidão. Esses ingredientes constantes, ainda que em doses variáveis, do caráter dos seres civilizados.
Por trás dos destemperos verbais e, às vezes, físicos, observados em todos os setores de serviço, haverá sempre o descompasso entre o pretendido por quem chegou e o disponibilizado por quem estava lá, supostamente à espera de servir.
Infelizmente, a mercadoria mais requisitada se tornou peça rara: o prazer de ajudar. E muitas vezes, na contramão da exigência básica para quem se dispõe ao contato com o público, está um azedo com um crachá indefectível: o olhar de intervalo. É aquela mirada rasante que passa a centímetros da sua sobrancelha, mas nunca encontra o seu olho suplicante. E ele jamais encara o cliente potencial, porque não está interessado em estabelecer vínculo com ninguém que lhe venha interromper o ócio.
Pois este atravanco do desenvolvimento social pode estar agora mesmo espantando fregueses na sua lancheria, atrasando a vida das pessoas na sua farmácia, irritando clientes no seu cartório, ou humilhando velhinhos na fila do banco, que você gerencia com tanto orgulho.
E se você dirige um hospital, tenha cuidado, este tipo invariavelmente se envolve em brigas violentas, porque quando do outro lado do balcão está alguém com dor, ou um aflito pela falta de notícias do filho acidentado, o nível de tolerância cai muito. Compreensivelmente.
Como gostar de gente, a matéria prima carente nestes tipos, não pode ser ensinada, economize o tempo perdido com treinamentos inúteis, e demita-os. Na semana passada, encontrei um desses modelos jogando as malas com violência nas esteiras do aeroporto. Menos mal, elas não sentem dor.
JJCamargo

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