quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Carnaval é Cultura...

                                                                   

             
Com o processo de globalização e com o avanço das novas tecnologias a identidade cultural dos povos vai sendo lentamente diluída.O que resta é a cultura popular, já que ela é basicamente, intrinsecamente local, fruto dos hábitos, dos costumes cultivados ao longo da vida do dia a dia, das influências de formação legadas pela construção histórica do país. O Brasil, como sabemos, tem sua identidade calcada de forma indelével na cultura popular, que foi o resultado da síntese das raízes ibéricas,indígena e africana. Este amalgama produziu, entre outras coisas, como um de seus pontos altos a música. Música que envolve, contagia corações e multidões, nos seus mais variados ritmos. Compositores da mais alta expressão nos legaram verdadeiros hinos do carnaval, marchas e sambas antológicos. Com criatividade e romantismo transformaram melodias em expressão popular de alegria e amor. O carnaval tem raízes psicológicas, sociais e culturais. Neste período o povo exprime suas emoções, incentiva fantasias e extravasa sentimentos de felicidade. Sonhos, alegria e emoção são revelados através da música. 

No Brasil, o carnaval começou trazido pelos portugueses, na comemoração do entrudo (de introitus, “começo, entrada”), que festejava a entrada da primavera e abria as solenidades litúrgicas da Quaresma, período de abstinência de carne – palavra que designa o nome carnaval. O entrudo era uma festa de rua barulhenta, suja e, por vezes, violenta. A partir da segunda metade do século 19, o entrudo nas ruas passou a conviver com o carnaval à moda européia – bailes de máscaras em teatros e clubes. No entrudo, camadas mais pobres ou de classe média, ao lado dos negros, dançavam ao som de instrumentos de percussão e cantavam curtas quadrinhas de autores anônimos. Nos salões os bailes eram animados por bandas que tocavam os ritmos europeus da época, como xote, polca, valsa, etc. Aos poucos surgiram os clubes e sociedades – que congregavam os mais ricos e promoviam bailes e luxuosos desfiles de carros alegóricos – cordões que saíam às ruas e nos quais conviviam diferentes classes sociais e ranchos e blocos – que também ganhavam as ruas, compostos de classes mais populares.

A primeira música feita exclusivamente para o carnaval é Ô Abre Alas, composta em 1899 por Chiquinha Gonzaga para o Cordão Rosa de Ouro. Um primeiro passo rumo à concepção atual dos desfiles de escolas de samba – marca internacional do carnaval brasileiro –, que incorpora o luxo dos carros alegóricos dos ricos à dança, ao ritmo e ao canto do carnaval dos pobres, foi dado por Sinhô, compositor do final do século 19. Entre os anos de 1910 e 1920, o samba foi aos poucos se definindo, junto com a marcha, como o ritmo preferencial do carnaval. Letras muitas vezes recheadas de sátiras políticas e sociais. 

O samba transformou-se na tradução mais eloqüente do povo brasileiro. Música que envolve, contagia corações e multidões. Até o aparecimento do gênero musical produzido especialmente para o carnaval com o nome de samba – o famoso Pelo Telefone, registrado pelos freqüentadores da casa da Tia Ciata, Donga e Mauro de Almeida – o carnaval refletiu, de maneira mais transparente, as contradições expressas na confusão que resultava da forma indecisa pela qual as novas camadas sociais procuravam enquadrar-se na “festa do povo”. Às vésperas da 1ª. Guerra Mundial, as diferentes classes sociais brasileiras divertiam-se em diferentes carnavais – os pobres nas praças, os ricos nos corsos de automóveis e nos grandes clubes. 

A festa ainda não tinha descoberto o ritmo capaz de lhe conferir um denominador comum musical. O grande achado musical do carnaval brasileiro foi o samba, que ao misturar ritmos que animavam as festas do proletariado, ganhou a classe média e também a elite. É lamentável que hoje as comemorações populares tradicionais são cada vez mais vistas como fonte de renda. As brincadeiras populares, os blocos de rua, os folguedos perderam espaço nas grandes cidades e deram lugar ao carnaval institucionalizado e até globalizado, vendido no mundo todo como fonte de renda para canais de televisão, revistas de massa e turismo. 

Assim, a riqueza e a diversidade de nossas culturas são apagadas e apenas as formas mais rentáveis têm destaque. Nas pequenas e médias cidades o carnaval mais puro ainda resiste a expressão de uma das mais autênticas manifestações de nossa gente.
Bom carnaval a todos! 

(José Ernani de Almeida)


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