quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Natal: festa da humanidade de Deus e da comensalidade...



O Natal é repleto de significados. Um deles foi sequestrado pela cultura do consumo que, ao invés do Menino Jesus, prefere a figura do bom velhinho, o Papai Noel, porque é mais apelativo para os negócios. O Menino Jesus, ao invés, fala da criança interior que carregamos sempre dentro de nós, que sente necessidade de ser cuidada e quando, já crescida, tem o impulso de cuidar. É aquele pedaço do paraíso que não foi totalmente perdido, feito de inocência, de espontaneidade, de encantamento, de jogo e de convivência com os outros sem qualquer discriminação..

Para os cristãos é a celebração da “proximidade e da humanidade” de nosso Deus, como se diz na epístola a Tito (3,4). Deus deixou-se apaixonar pelo ser humano que quis ser um deles. Como diz belamente Fernando Pessoa em seu poema sobre o Natal: “Ele é a eterna Criança, o Deus que faltava; ele é o divino que sorri e que brinca; a criança tão humana que é divina”.


Agora temos um Deus criança e não um Deus, juiz severo de nossos atos e da história humana. Que alegria interior sentimos quando pensamos que seremos julgado por um Deus criança. Mais que nos condenar, quer conviver e se entreter conosco eternamente.
O seu nascimento provocou uma comoção cósmica. Um texto da liturgia cristã diz de forma simbólica:”Então as folhas que farfalhavam, pararam como mortas; então o vento que sussurrava, ficou parado no ar; então o galo que cantava, parou no meio de seu canto; então as águas do riacho que corriam, se estancaram; então, as ovelhas que pastavam, ficaram imóveis; então o pastor que erguia o cajado, ficou como que petrificado; então nesse momento, tudo parou, tudo silenciou, tudo suspendeu o seu curso: nasceu Jesus, o Salvador das gentes e do universo”.


O Natal é uma festa de luz, de fraternidade universal, festa da família reunida ao redor de uma mesa. Mais que comer, comunga-se da vida de uns e de outros e da generosidade dos frutos de nossa Mãe Terra e da arte culinária do trabalho humano.
Por um momento, esquecemos os afazeres cotidianos, o peso da existência trabalhosa, as tensões entre familiares e amigos e nos irmanamos na alegre comensalidade. Comensalidade significa comer juntos ao redor da mesma mesa (mensa) como se fazia outrora: todos da família se reuniam, conversavam, comiam e bebiam à mesa, pais, filhos e filhas.



A comensalidade é tão central que está ligada à própria emergência do ser humano enquanto humano. Há sete milhões de anos começou a separação lenta e progressiva entre os símios superiores e os humanos, a partir de um ancestral comum. A singularidade do ser humano, à diferença dos animais, é reunir os alimentos, distribui-los entre todos, começando pelos mais novos e pelos idosos e depois entre todos.


A comensalidade supõe a cooperação e a solidariedade de uns para com os outros. Foi ela que propiciou o salto da animalidade para a humanidade. O que foi verdadeiro ontem, continua verdadeiro hoje. Por isso nos dói tanto ao saber que milhões e milhões não têm nada para repartir e passam fome.


No dia 11 de setembro de 2001 ocorreu a conhecida atrocidade: os aviões que se jogaram contra as Torres Gêmeas. No ato, morreram cerca de três mil pessoas.
No mesmo dia, exatamente, 16.400 crianças, abaixo de cinco anos, morriam de fome e de desnutrição. No dia seguinte e durante todo o ano doze milhões de crianças foram vitimadas pela fome. E ninguém ficou e fica estarrecido diante desta catástrofe humana.
Neste Natal de alegria e de fraternidade não podemos esquecer esses que Jesus chamou de “meus irmãos e minhas irmãs menores”(Mt 25, 40) que não podem receber presentes nem comer qualquer coisa.


Mas não obstante este abatimento, celebremos e cantemos, cantemos e nos alegremos porque nunca mais estaremos sós. O Menino se chama Jesus, o Emanuel que quer dizer: “Deus conosco”. Vale esse pequeno verso que nos faz pensar sobre nossa compreensão de Deus, revelada no Natal:


Todo menino quer ser homem.
Todo homem quer ser rei.
Todo rei quer ser ‘deus’.
Só Deus quis ser menino”.
Feliz Festa de Natal do ano da graça de 2014.  


   Leonardo Boff                                

domingo, 7 de dezembro de 2014

A morte...



! O que pensar, dizer e agir diante da morte? Mas,... o que é mesmo a “morte”???

O fim do amor (divino) entre mãe e filho?


 Do carinho entre pessoas que conviveram


 durante anos? Ou, simplesmente, o esgotamento dos órgãos?! 

Se pensarmos que a morte é o fim, assim será! Teremos, então, de ‘arcar’ com as 


consequências.



Mas quando pensamos que a morte é simples viagem na Barca de Caronte, e que, em


 breve, quando Deus nos permitir, estaremos novamente reunidos, então aquela morte 

passa a ser somente um “até logo”!   Ninguém morre, somente troca de vestimenta.





A saudade passa a ser considerada como amiga, não como algoz.


 A recordação dos

 momentos felizes dá-nos força para seguir em frente, entendo que a vida (aqui na Terra) 

aqui é simples passagem (um segundo) de uma vida maior (eterna).

Não é necessário ser reencarnacionista, para acreditar que a vida continua. Jesus, a dois


mil anos, “matou a morte”!

Concluo este pequeno pensamento com a síntese memorável e profunda de André Luiz 


(Espírito), pelas mãos abençoadas de Francisco Cândido Xavier:

[...]
Uma existência é um ato.


Um corpo - uma veste.


Um século - um dia.



Um serviço - uma experiência.


Um triunfo - uma aquisição.


Uma morte - um sopro renovador.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Laços de Família...



Diário Santa Maria, dia 02 de dezembro/2014
Laços de família

Dentro da intimidade dos lares, de forma velada e quase imperceptível, uma espécie de 
violência moral é praticada e se difunde rapidamente, é a chamada “Alienação Parental”
. Ela atenta contra o mais íntimo e sensível vínculo do ser humano: as relações de filiações.
 Normalmente é praticada pela pessoa que mais deveria se preocupar com a preservação 
de tal vínculo: o genitor guardião. As vítimas diretas são os filhos, usados como
instrumento de agressão contra os genitores não guardiões.
A prática da alienação parental encontra terreno fértil nas situações de guarda unilateral 
que, infelizmente, constituem-se na esmagadora maioria das decisões e acordos nas
 dissoluções de sociedades conjugais. O Senado Federal aprovou recentemente o Projeto
 de Lei 117/2013, que determina que a guarda compartilhada dos filhos seja obrigatória,
 desde que o pai e a mãe tenham condições de criá-los e que tenham interesse na guarda
 dos mesmos, tornando a modalidade unilateral, de forma expressa, como exceção

Mais do que simplesmente definir-se essa forma de guarda conjunta, ainda será necessária
 a sua organização concreta, através de um planejamento de convivência parental, eis que 
guarda compartilhada não se confunde com visitação livre.

Para tanto, além dos pais, outras pessoas devem exercer papel efetivo na busca dessa
 transformação. Os juízes, que não podem se eximir de sua autoridade no caso de litígio; o
 promotor, que irá acompanhar o processo com a finalidade protetiva que lhe é inerente; os
advogados, que devem ter em mente que o exercício da advocacia, na área de família, não
 pode ser combativo e sim conciliador; os educadores e demais participantes da rotina das 
crianças e adolescentes que devem respeitar o processo de adequação familiar. 
Se a entidade familiar se desajustou como sociedade conjugal, o vínculo de filiação é 
indissolúvel. Ele deve ser respeitado e preservado, sob pena de se desestabilizar o mais
 importante de todos os laços de família: a relação entre pais e filhos
.
Bernadete Schleder dos Santos


Ana Rosa...

Depoimento da atriz Ana Rosa sobre a dor da perda de uma filha

"Algumas vezes eu representei cenas de perdas de entes queridos em novelas. No dia 17 de novembro de 1995, no velório de minha filha Ana Luisa, nascida em São Paulo no dia 10 de dezembro de 1976, eu não queria acreditar que estivesse vivendo aquilo de verdade.

No dia seguinte, saí para comprar alguns presentes de Natal. Afinal, meus outros seis filhos ainda estavam ali e precisavam da mãe. Mas eu parecia um zumbi. Numa loja, me senti mal. Tontura, fraqueza, parecia que meu peito iria explodir, que eu não iria agüentar tanta dor. Pedi à vendedora que me deixasse sentar um pouco. Eu estava quase sufocando, as lágrimas queriam saltar de meus olhos. Mas eu não queria chorar. Queria esconder minha dor, fazer de conta que aquilo não havia acontecido comigo. Bebi água, respirei fundo e saí ainda zonza.

Eu sempre acreditei que iria terminar de criar minha filha, como todos os outros. Que iria vê-la formar-se em veterinária. Vê-la casada, com filhos. Achava que teria sempre a Aninha ao meu lado. Um dia, ela me contou que quando era pequena e eu saía pra trabalhar, ela sentia medo de que eu não voltasse. Por isso ficava sempre na porta de casa me olhando até eu sumir de sua vista. Por isso vivia grudada em mim.

Imagino que ela já pressentia ainda criança, que iríamos nos separar cedo. Só que foi ela a ir embora. Foi ela que saiu e não voltou mais. Foi ela que me deixou com a sua saudade. Para amenizar a falta, o vazio que ela deixou, eu ficava horas revendo os vídeos mais recentes com suas imagens. Nossas viagens, festas de aniversários, a formatura da irmã, seu jeitinho lindo tão meu conhecido de sentir vergonha.

Ela com o primeiro e único namorado. O gesto característico de arrumar os cabelos. A sua primeira apresentação de piano. Nesse vídeo então, eu ficava namorando suas mãos de dedos longos e finos. Até hoje eu me lembro de cada detalhe das mãos da Aninha. Assim como me lembro de cada detalhe de seus pés, do seu rosto...
Dali pra frente, o que mais me chocava e surpreendia era que todo o resto do mundo continuava igual. Como se nada tivesse acontecido: o sol nascia e se punha todos os dias, as pessoas andavam pelas ruas. O mesmo movimento, barulho. O mundo continuava a girar. Tudo, tudo igual. Só na minha casa, na minha família, dentro de mim, é que nada mais voltaria a ser como antes. Faltava minha filha, Ana Luisa!

Eu passava, quase diariamente, nos lugares comuns: o colégio Imaculada Conceição, em Botafogo. Cinema, lanchonete, restaurante, o metrô, onde tantas e tantas vezes viajamos juntas. A loja das comprinhas, o shopping, o parquinho, o clube onde fazia natação. A praia de Botafogo onde ela foi atropelada, o hospital Miguel Couto, onde passamos as horas mais angustiosas de nossas vidas.
O cemitério São João Batista, onde repousam seus restos mortais. Até hoje cada um desses lugares me lembra alguma coisa de minha filha. Até hoje guardo as lembranças de seus abraços, seus chamegos, o cheirinho da sua pele, o calor, seu carinho e aconchego. Ana vivia literalmente pendurada em mim. Já grandona, maior que eu, mas sempre como se fosse meu nenê pedindo colo.

Saudade. Saudade. Saudade, minha Aninha.

Não fosse a minha fé e a convicção de que a vida não termina com a morte, não fossem os outros filhos que ainda precisavam de mim, acho que teria pirado. Além da família, o trabalho, a terapia e o estudo da doutrina espírita me deram forças para superar a separação e a falta da Ana Luisa.
Sou e serei eternamente grata ao meu Pai do Céu, porque fui agraciada com muitos sinais de que a separação é apenas temporária. Alguns dias após sua passagem entrei em seu quartinho que ficou inundado pelo cheiro de rosas. Instintivamente fui olhar pela janela. Naturalmente o cheiro não vinha de fora. O perfume intenso era só ali dentro.
Um mês depois, no grupo que eu frequentava no Centro Seara Fraterna, minha filha se manifestou. Ainda meio confusa pela mudança abrupta e repentina, mas já consciente de sua passagem. Naquela noite, o buraco no meu peito que parecia uma ferida sangrando, mudou de aspecto. Continuava a doer, mas a certeza de que minha filha continuava e continua viva em alguma outra dimensão me trouxe uma nova perspectiva. A de que eu poderia chorar pela sua ausência, nunca pelo seu fim.
Dalí pra frente, algumas vezes vi, em outras pressenti, sua essência ao meu lado. No decorrer desses doze anos, recebi, por acréscimo de misericórdia, um bom número de mensagens dela. Uma das últimas foi através de um médium reconhecido, que foi fazer uma palestra num evento que eu apresentava. Sem que eu esperasse ou solicitasse, ele disse que via uma jovem ao meu lado – me descreveu exatamente minha filha - e que ela me apontava para ele dizendo: é esta aqui, ó.

Esta é que é a minha mãe. Quando me sentei, ele disse que ela sentou-se no meu colo. Entre as várias coisas no recado que me mandou, encerrou dizendo que as violetas (enceno a peça “Violetas na janela” há 11 anos) que ela cultiva onde se encontra, não serão colocadas na janela, e sim, serão usadas para fazer um tapete de flores para eu pisar quando chegar lá."


Depoimento da atriz Ana Rosa sobre a dor da perda de uma filha


"Algumas vezes eu representei cenas de perdas de entes queridos em novelas. No dia 17 de novembro de 1995, no velório de minha filha Ana Luisa, nascida em São Paulo no dia 10 de dezembro de 1976, eu não queria acreditar que estivesse vivendo aquilo de verdade.
No dia seguinte, saí para comprar alguns presentes de Natal. Afinal, meus outros seis filhos ainda estavam ali e precisavam da mãe. Mas eu parecia um zumbi. Numa loja, me senti mal. Tontura, fraqueza, parecia que meu peito iria explodir, que eu não iria agüentar tanta dor. Pedi à vendedora que me deixasse sentar um pouco. Eu estava quase sufocando, as lágrimas queriam saltar de meus olhos. Mas eu não queria chorar. Queria esconder minha dor, fazer de conta que aquilo não havia acontecido comigo. Bebi água, respirei fundo e saí ainda zonza.
Eu sempre acreditei que iria terminar de criar minha filha, como todos os outros. Que iria vê-la formar-se em veterinária. Vê-la casada, com filhos. Achava que teria sempre a Aninha ao meu lado. Um dia, ela me contou que quando era pequena e eu saía pra trabalhar, ela sentia medo de que eu não voltasse. Por isso ficava sempre na porta de casa me olhando até eu sumir de sua vista. Por isso vivia grudada em mim.
Imagino que ela já pressentia ainda criança, que iríamos nos separar cedo. Só que foi ela a ir embora. Foi ela que saiu e não voltou mais. Foi ela que me deixou com a sua saudade. Para amenizar a falta, o vazio que ela deixou, eu ficava horas revendo os vídeos mais recentes com suas imagens. Nossas viagens, festas de aniversários, a formatura da irmã, seu jeitinho lindo tão meu conhecido de sentir vergonha.
Ela com o primeiro e único namorado. O gesto característico de arrumar os cabelos. A sua primeira apresentação de piano. Nesse vídeo então, eu ficava namorando suas mãos de dedos longos e finos. Até hoje eu me lembro de cada detalhe das mãos da Aninha. Assim como me lembro de cada detalhe de seus pés, do seu rosto...
Dali pra frente, o que mais me chocava e surpreendia era que todo o resto do mundo continuava igual. Como se nada tivesse acontecido: o sol nascia e se punha todos os dias, as pessoas andavam pelas ruas. O mesmo movimento, barulho. O mundo continuava a girar. Tudo, tudo igual. Só na minha casa, na minha família, dentro de mim, é que nada mais voltaria a ser como antes. Faltava minha filha, Ana Luisa!
Eu passava, quase diariamente, nos lugares comuns: o colégio Imaculada Conceição, em Botafogo. Cinema, lanchonete, restaurante, o metrô, onde tantas e tantas vezes viajamos juntas. A loja das comprinhas, o shopping, o parquinho, o clube onde fazia natação. A praia de Botafogo onde ela foi atropelada, o hospital Miguel Couto, onde passamos as horas mais angustiosas de nossas vidas.
O cemitério São João Batista, onde repousam seus restos mortais. Até hoje cada um desses lugares me lembra alguma coisa de minha filha. Até hoje guardo as lembranças de seus abraços, seus chamegos, o cheirinho da sua pele, o calor, seu carinho e aconchego. Ana vivia literalmente pendurada em mim. Já grandona, maior que eu, mas sempre como se fosse meu nenê pedindo colo.
Saudade. Saudade. Saudade, minha Aninha.
Não fosse a minha fé e a convicção de que a vida não termina com a morte, não fossem os outros filhos que ainda precisavam de mim, acho que teria pirado. Além da família, o trabalho, a terapia e o estudo da doutrina espírita me deram forças para superar a separação e a falta da Ana Luisa.
Sou e serei eternamente grata ao meu Pai do Céu, porque fui agraciada com muitos sinais de que a separação é apenas temporária. Alguns dias após sua passagem entrei em seu quartinho que ficou inundado pelo cheiro de rosas. Instintivamente fui olhar pela janela. Naturalmente o cheiro não vinha de fora. O perfume intenso era só ali dentro.
Um mês depois, no grupo que eu frequentava no Centro Seara Fraterna, minha filha se manifestou. Ainda meio confusa pela mudança abrupta e repentina, mas já consciente de sua passagem. Naquela noite, o buraco no meu peito que parecia uma ferida sangrando, mudou de aspecto. Continuava a doer, mas a certeza de que minha filha continuava e continua viva em alguma outra dimensão me trouxe uma nova perspectiva. A de que eu poderia chorar pela sua ausência, nunca pelo seu fim.
Dalí pra frente, algumas vezes vi, em outras pressenti, sua essência ao meu lado. No decorrer desses doze anos, recebi, por acréscimo de misericórdia, um bom número de mensagens dela. Uma das últimas foi através de um médium reconhecido, que foi fazer uma palestra num evento que eu apresentava. Sem que eu esperasse ou solicitasse, ele disse que via uma jovem ao meu lado – me descreveu exatamente minha filha - e que ela me apontava para ele dizendo: é esta aqui, ó.
Esta é que é a minha mãe. Quando me sentei, ele disse que ela sentou-se no meu colo. Entre as várias coisas no recado que me mandou, encerrou dizendo que as violetas (enceno a peça “Violetas na janela” há 11 anos) que ela cultiva onde se encontra, não serão colocadas na janela, e sim, serão usadas para fazer um tapete de flores para eu pisar quando chegar lá."