quinta-feira, 29 de agosto de 2013

A gente morre todos os dias.... Mas se esquece e levanta...



Graça Taguti*
"Morrer tão completamente.
Que um dia ao lerem o teu nome num papel perguntem:
Quem foi?"
- Manuel Bandeira -
Se tem algo que desperta muita ira em nós é o descontrole sobre a hora da nossa morte. E sobre o momento da nossa concepção e nascimento. Sentimo-nos, paradoxalmente, cada vez mais empoderados, tendo como cúmplices as sucessivas invenções das novas tecnologias. O domínio sobre o universo, objetos coisas e pessoas. A era glass, a era touch e a era do controle (a última apontando a implacável vigilância da internet sobre nossa minuciosa intimidade) convivem na atualidade, aparentemente de mãos dadas. Fato é que simulando nosso império volitivo e ditatorial sobre joysticks materiais e virtuais sentimo-nos firmes comandantes de navios nas ondas da web e da vida.

A gente morre quando acorda. Morre de tédio, de preguiça, morre de mesmice, ou não, como apregoaria Caetano Veloso, com aquela voz de fruta sumarenta e lenta degustada em algum recanto nordestino. Tem pessoas que já morreram faz tempo. E nunca desconfiaram disso. Morrem de medo de encarar o medo, de colocar a coragem debaixo de um braço e o medo apoiado no outro braço e prosseguir caminhando, como ressaltaria Brecht.




Morre-se de pavor de mudar cacoetes, opiniões, certezas, repetindo automaticamente velhos e ranhetas comportamentos. Morre-se de medo de encarar as verdades da alma, no espelho da consciência, cujos reflexos nem sempre soam agradáveis ou digestivos. Medo de e enfrentar a relação puída, mas mantida apesar do visível desgaste, devido às oportunas muletas financeiras e quiçá psicológicas. A gente morre na repetição infindável de defeitos pra lá de conhecidos, nossos e dos outros, e anunciados instante após instante em nossa gestualidade e fala reveladora.

Chico Buarque já entoava em sua composição “Cotidiano”: “Todo dia ela faz tudo sempre igual, me sacode às seis horas da manhã”. Ou ainda, o seminal poeta clamava em “Construção” — de cuja música reproduzo um trecho:

“Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
“Morreu na contramão atrapalhando o sábado”.

Vivemos rodeados por mortes commoditizadas, sem rosto nem débeis desejos.

Como se salvar de tamanha e paralítica incompetência atitudinal? Tornar-se aficionado por séries televisivas centradas em zumbis ou vampiros, como “Resident Evil” e similares. Sabe-se que os zumbis namoram a eternidade. O protótipo da infinitude, ainda que se arrastem apodrecidos por terrenos estéreis.

A gente morre de frio e de mentiras. De amor escondido e expurgado pela covardia. De afeto enrijecido e estanque. Da flor não manifesta num discurso que se pretendia doce. Poetas, filósofos, estudiosos, escritores circularam o fascínio deste tema. Na religião, os espíritas, erguem a vitoriosa e redentora bandeira da reencarnação. O rabino Nilton Bonder especula sobre a salvação na obra “A Arte de se Salvar — Sobre Desespero e Morte”. Especialistas no assunto ocupam-se, como a dra. Elisabeth Kübler-Ross, fundadora da Tanatologia (estudo científico da Morte) de auxiliar doentes terminais em suas despedidas.

O cineasta Ingmar Bergman em “O Sétimo Selo”, elege a morte como personagem central da trama. Ariano Suassuna, dramaturgo e romancista apregoa: “Tenho duas armas para lutar contra o desespero, a tristeza e até a morte: o riso a cavalo e o galope do sonho. É com isso que enfrento essa dura e fascinante tarefa de viver”.

Muita gente morre de silêncio. Não joga para fora as fecundas cirandas do coração. Morre de ódio, de inveja. E finge que estes sentimentos, tão descivilizados e deselegantes, pertencem somente aos outros. De soberba, arrogância e interjeições também se morre. E ainda quem deixa a paixão morrer no sexo e faz amor sem prazer. Como quem come uma sobremesa de nariz entupido.

Alguns poetas passeiam com naturalidade pela finitude. Pois parece que sempre há algo de romântico em dizer adeus à existência. Mário Quintana divaga: “Se vale a pena viver e se a morte faz parte da vida, então, morrer também vale a pena”.

Há gente que morre de orgulho, mas não dá o braço a torcer. Criaturas que jamais conheceram a grandeza do perdão, do abraço, da palavra sem mascaramentos.

Impossível deixar de citar também o breve excerto de Manoel Bandeira, no poema “A Morte Absoluta”:

“Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra.
A lembrança de uma sombra.
Em nenhum coração, em nenhum pensamento.
Em nenhuma epiderme.
Morrer tão completamente.
Que um dia ao lerem o teu nome num papel perguntem: Quem foi?
Morrer mais completamente ainda.
Sem deixar sequer esse nome”.

Nosso amantíssimo Drummond, traça versos em carne viva em “Os Ombros Suportam o Mundo” sem qualquer anestesia metafórica, declara na estrofe final deste seu poema:

“Alguns, achando bárbaro o espetáculo.
Prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação”.

 (Graça Taguti)

* Professora. Escritora.
Fonte: http://www.revistabula.com/16/06/2013

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Rádio...



Em 1976 comprei meu primeiro radinho a pilhas. Era vermelho (não tinha azul) e foi adquirido numa filial da Grazziotin, onde havia sido o saudoso Cine Imperial. Sou dos tempos do rádio porque assim eram meus pais. Desde o Direito de Nascer, do Sheik de Agadir, de Antônio Maria – radionovelas que ouvia junto a Dona Neca, quanto às guarânias, tangos e boleros melodiosos que meu pai sintonizava à noite, nas rádios de Buenos Aires. Depois, vieram a Rádio Guaíba, no futebol e Farroupilha, no Grande Rodeio Coringa. Quando mudei para Passo Fundo em 1970, Maurício Sirotsky não morava mais aqui. Mas, havia Meirelles e os irmãos Freitag, da Rádio Passo Fundo, que tinha também Valadares e Argeu Santarém. Fiquei impressionado com o poder de comunicação destes radialistas. Um dia percebi José Ernani, Guaracy Teixeira, Walter Filho numa Planalto AM que parecia FM. Para os populares e apaixonados da vila, como eu, tinha Dino Rosa na Municipal que também contava com Jarbas, Duarzan e Rafi Dadia. Meus sonhos viajavam quase sempre para São Paulo, para a Bandeirantes, no horário das 12 às 14 horas para ouvir o maior de todos, Hélio Ribeiro. Bebendo de seu Poder da Mensagem sedimentava a idéia de que o mundo poderia e deveria ser melhor porque dependia só da gente. 

Outras vezes, na madrugada, na Super Rádio Tupi, sentia-me boêmio ao ouvir Luciano Alves e seu programa que lançava músicas que só tocariam aqui na terrinha em quatro meses. A TV não conseguiu superar o rádio e este nunca vai morrer porque arrebata. Sempre tive a noção clara da importância do comunicador em frente à latinha. Voz firme, pausada – voz forte, grossa ou estridente – voz melodiosa e suave. Vozes do encanto, do sonho, da realidade, da denúncia, da convocação, da fofoca, da sociedade. Qual seria o rosto, a face dona daquela voz? A objetividade de Sérgio Jockyman, o destempero de José Antônio Daudt, a ironia de Lauro Quadros, a técnica do professor Rui Carlos Ostermann – puxa, quanta coisa. Mais tarde, o Brasil Grande do Sul, de Jayme Caetano Braun. Meu radinho, inseparável em duzentos mil jogos de Grêmio, Gaúcho e Passo Fundo. 

Um dia, em 1981, conheci um monstro do Rádio. 

Atravessando a Sete de Setembro, de calça branca e uma bolsa preta, meu velho amigo Turiaçu Ferreira apontou – aquele ali é o Júlio Rosa. Era o Júlio, da Uirapuru, da Rádio do Povo, era o radialista e ex-policial que denunciava, era o que transformava uma pautinha em algo muito maior, era a voz do desassistido, era o poderoso comunicador que Porto Alegre remetera a nós. Depois, vereador e que a ironia do destino não permitiu mais um reconhecimento à luta pelas coisas públicas. Morreu exatamente no dia em que receberia homenagem na Câmara de Vereadores. Um dia, em 2003 o destino nos aproximou. Foram muitas entrevistas sobre urgências-emergências médicas, sobre atendimento pré-hospitalar. 

Criamos um programa na Rádio Planalto chamado “Enquanto o Médico Não Vem”, em que tratávamos de cuidados iniciais até o socorro definitivo. Foram em duas sextas-feiras que, no seu programa, informei sobre as mortes de meus pais. Em desabafos confidenciais percebia a frustração do velho jornalista e policial ao não poder relatar publicamente o que sabia sobre os ilícitos e o lado podre da nossa sociedade. Eu dizia para ele deixar escrito. Ele respondia: seria morto ou respingaria na minha família. Há uns dias, vi o velho comunicador deitado num leito da emergência do São Vicente. Percebi o desiderato, o mecanismo da despedida. Tentei contato, ele estava sonolento, não respondeu. Não pude e não quis me despedir. Amigos não se despedem, mesmo porque não há razão para despedidas já que a gente sabe, não é Júlio Rosa, que a gente se encontra logo ali adiante. Bom descanso.


     (Jorge Anunciação)

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

O que ensinamos sem perceber...

J.J. Camargo: O que ensinamos sem perceber  Edu Oliveira/Arte ZH

Mais vida no outono da vida...



DEPOIS DO AUMENTO DA LONGEVIDADE, O DESAFIO AGORA É GARANTIR BEM-ESTAR PARA A TERCEIRA IDADE


A humanidade está vivendo mais, mas esses anos adicionais não estão sendo necessariamente melhor vividos. Com a expectativa de vida do brasileiro tendo aumento mais de 11 anos nas últimas três décadas, o desafio agora é agregar qualidade à chamada terceira idade.
 Doenças crônicas e degenerativas, problemas cardiovasculares e físicos, distúrbios emocionais e psicológicos tornam os últimos anos de existência de sofrimento para muitos idosos.

No passado, as pessoas morriam mais jovens porque não havia vacinas, antibióticos, pouco se sabia sobre controle de doenças infecciosas e não se tinha ideia de que o estilo de vida influenciava tanto na saúde.
 Com maior acesso à informação, foram adquiridos discutido muito a segunda carreira, o que tem a ver com inserção social – diz Denise.
  Novos hábitos e cuidados com o corpo e a mente. Melhoraram também o controle de doenças e de fatores de riscos por conta do conhecimento médico-científico, explica a médica sanitarista do Departamento de Medicina Preventiva da Universidade de São Paulo (USP).

 
 Hoje há uma sobrevida maior. Porém, o que fazer para manter a qualidade nestes anos a mais tem inquietado os especialistas.
– A forma como as pessoas se aposentam, sem muitas perspectivas e desafios, nos faz questionar se devemos deixar uma pessoa lúcida fora do mercado de trabalho.
                         Os cuidados com a saúde devem começar na juventude

Diretor de defesa profissional da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, João Senger explica que o desafio não é mais aumentar a longevidade, e sim ter vida longa com qualidade:

– Todo gaúcho, quando chega aos 60, tem mais 12 ou 13 anos de sobrevida. Só que a metade desses anos é de dependência. Não sei se isso tem valor.

Entre as questões que comprometem a autonomia dos idosos estão as fraturas, as doenças crônicas, como Alzheimer, as cardiovasculares, como infarto, e as cerebrovasculares, como o AVC.
 Segundo o professor da Faculdade de Medicina da UFRGS Emilio Moriguchi, as pessoas chegam a idades avançadas com tantas debilidades porque não tomam os cuidados que deveriam.
 Os principais erros são alimentação desequilibrada, sedentarismo, fumar e beber em excesso e  sobrepeso.

– Os governos deveriam dar mais atenção aos dados disponíveis para se conscientizar da relevância de prevenir e tratar as doenças relacionadas ao envelhecimento
 
(Moriguchi)

A arte de cuidar enfermos...




Nos últimos anos tenho trabalhado de forma aprofundada a categoria do cuidador, especialmente nos livros: Saber Cuidar e O Cuidado Necessário (Vozes).

 O cuidado mais que uma técnica ou uma virtude entre outras, representa uma arte e um paradigma novo de relação para com a natureza e com as relações humanas, amoroso, diligente e participativo.

 Tenho tomado parte de muitos encontros e congressos de operadores da saúde com os quais pude dialogar e aprender, pois o cuidador é a ética natural desta atividade tão sagrada.

Retomo aqui algumas idéias referentes às atitudes que devem estar presentes em quem cuida de enfermos seja em casa seja no hospital.

 Vejamos algumas delas entre outras.

Compaixão:

 É a capacidade de colocar-se no lugar do outro e sentir com ele. Não dar-lhe a impressão que está só e entregue à sua própria dor.

Toque da carícia essencial:

Tocar o outro é devolver-lhe a certeza de que pertence à nossa humanidade. O toque da carícia é uma manifestação de amor.

 Muitas vezes, a doença é um sinal de que o paciente quer se comunicar, falar e ser ouvido. Quer identificar um sentido na doença.

 O enfermeiro ou a enfermeira ou médico e a médica podem ajudá-lo a se abrir e a falar.

Testemunha uma enfermeira: “quando te toco, te cuido; quando te cuido te toco; se és um idoso te cuido quando estás cansado; te toco quando te abraço; te toco quando estás chorando; te cuido quando não estás mais podendo andar”. 

Assistência judiciosa:

 O paciente precisa de ajuda e a enfermeira ou o enfermeiro deseja cuidar. A convergência destes dois movimentos gera a reciprocidade e a superação do sentimento de uma relação desigual. A assistência deve ser judiciosa: tudo o que o paciente pode fazer, incentivá-lo a fazer e assisti-lo somente quando já não o pode fazer por si mesmo.

Devolver-lhe a confiança na vida:

 O que o paciente mais deseja é recuperar a saúde. Dai ser decisivo devolver-lhe a confiança na vida: em suas energias interiores, físicas, psíquicas e espirituais, pois elas atuam como verdadeiras medicinas.

 Incentivar gestos simbólicos, carregados de afeto. Não raro, os desenhos que a filhinha traz para o pai doente, suscita nele tanta energia e comoção que equivale a um coquetel de vitaminas.

Fazê-lo acolher a condição humana.

 Normalmente o paciente se interroga perplexo: “por que isso foi acontecer comigo, exatamente agora em que tudo na vida estava dando certo?
Por que, jovem ainda, sou acometido de grave doença”? Tais questonamentos remetem a uma reflexão humilde sobre a condition humaine que é, em todo o momento, exposta a riscos e à vulnerabilidades inesperadas.

Quem é sadio sempre pode ficar doente. E toda doença remete à saúde que é o valor de referência maior. Mas não conseguimos saltar por cima de nossa sombra e não há como não acolher a vida assim como é: sadia e enferma, bem sucedida e fragilizada, ardendo por vida e tendo que aceitar eventuais doenças e, no limite, a própria morte.

 É nestes momentos em que os pacientes fazem profundas revisões de vida. Não se contentam apenas com as explicações científicas (sempre necessárias), dadas pelo corpo médico mas anseiam por um sentido que surge a partir de um diálogo profundo com seu Self ou da palavra sábia de um parente, de um sacerdote, de um pastor ou de uma pessoa espiritual.
 Resgatam, então, valores cotidianos que antes sequer percebiam, redefinem seu desenho de vida e amadurecem. E acabam tendo paz.

Acompanhá-lo na grande travesia.

 Há um momento inevitável que todos, mesmo a pessoa mais idosa do mundo, devem morrer. É a lei da vida, sujeita à morte: uma travessia decisiva. Ela deve ser preparada por toda uma vida que se guiou por valores morais generosos, responsáveis e benfazejos.

Mas para a grande maioria, a morte é sofrida como um assalto e um sequestro, gerando sentimento de impotência. E então dá-se conta de que, finalmente, deve se entregar.

A presença discreta, respeitosa de alguém, da enfermeira ou do enfermeiro ou do parente próximo ou da amiga, pegando-lhe a mão, susurrando-lhe palavras de conforto e de coragem, convidando-o a ir ao encontro da Luz e ao seio de Deus que é Pai e Mãe de bondade, podem fazer com que o moribundo saia da vida sereno e agradecido pela existência que viveu.

Sussurar-lhe ao ouvido, se possui uma referência religiosa, as palavras tão consoladoras de São João: Se teu coração te acusa, saiba que Deus é maior que teu coração (3,20). Pode entregar-se tranquilamente a Deus cujo coração é de puro amor e de misericórdia.  Morrer é cair nos braços de Deus.

Aqui o cuidado se revela muito mais como arte que como técnica e supõe no agente de saúde densidade de vida, sentido espiritual e um olhar que vai para além da morte.

 Atingir este estágio é uma missão a que o enfermeiro e enfermeira e também os médicos e médicas devem buscar para serem plenamente servidores da vida

. Para todos valem as sábias palavras:


“A tragédia da vida não é a morte, mas aquilo que deixamos morrer dentro de nós enquanto vivemos”.  

(Leonardo Boff)

Um outro olhar...


 




No último domingo, a escritora Martha Medeiros lembrou de como nos sentimos separados da natureza. Um pensamento legado desde a Grécia Antiga, que teve seu apogeu com Descartes. Um fenômeno bem descrito na obra O Homem e o Mundo Natural, de Keith Thomas. O historiador de Oxford mostrou como o homem se relacionou com as plantas e os animais ao longo da história





Então, aproveitando os tempos de clamor por pluralidade, nada mais coerente que olhemos as coisas através de múltiplos olhares. Assim, proponho uma reflexão a propósito da Expointer, considerada a maior feira agropecuária da América Latina. Quando é comum que sejam exaltados números recordes e bilhões de reais em negócios. Neste cenário, não há dúvida de que esse setor é um dos alicerces da nossa economia, uma visão da qual poucos discordam. Todavia, corremos o risco de reforçar um forte paradigma, que muitos se dedicam em romper, de que somos superiores e temos o direito de explorar a natureza.

Convém salientar que, atualmente, grande parte da criação animal é baseada em métodos industriais. Logo, a visão bucólica dos animais no campo foi dando lugar ao confinamento e ao manejo intensivo. A lógica da produtividade, da maior eficiência associada à tecnologia, avançou pelo campo com a ideia de progresso. Neste contexto, os animais tornaram-se produtos. As suas necessidades se resumiram àquelas suficientes para maximizar o lucro. Assim, prevaleceu a máxima do menor custo e do maior ganho no menor tempo. O que as pessoas não sabem é que o rápido ganho de peso, a eficiência da nutrição e da genética são comemorados à custa do sofrimento animal, do surgimento de novas doenças e da poluição ambiental.




Nesta época, é comum que levemos nossas crianças ao parque para ver e interagir com os animais. Assim, acabamos por reforçar a ideia de que os animais são objetos descartáveis e não seres sencientes. A esta altura, algum leitor poderá afirmar que isto é conversa de ambientalista ou protetor de animais, mas lembro, como ressaltou Sir Thomas, que o homem aplicou a si mesmo a lógica da dominação, da domesticação e da exploração animal.

Portanto, faço votos que, ao visitar a feira, estejamos acompanhados do sentimento de empatia por aqueles seres que estão ali privados da vida que a natureza lhes reservou.




Renato Silvano Pulz
Professor de bem-estar animal

        

 

Nossos velhos...


                                                                                   
    

 Pais heróis e mães rainhas do lar.
Passamos boa parte da nossa existência cultivando estes estereótipos. Até que um dia o pai herói começa a passar o tempo todo sentado, resmunga baixinho e puxa uns assuntos sem pé nem cabeça... A rainha do lar começa a ter dificuldade de concluir as frases e dá pra implicar com a empregada. O que papai e mamãe fizeram para caducar de uma hora para outra ?!?
Fizeram só 80 anos. Nossos pais envelhecem. Ninguém havia nos preparado pra isso. Um belo dia eles perdem o garbo, ficam mais vulneráveis e adquirem umas manias bobas. Estão cansados de cuidar dos outros e de servir de exemplo:
Agora chegou a vez de serem cuidados e mimados por nós, nem que pra isso recorram a uma chantagenzinha emocional. Têm muita quilometragem rodada e sabem tudo, e o que não sabem eles inventam. Não fazem mais planos a longo prazo, agora dedicam-se a pequenas aventuras, como comer escondido tudo o que o médico proibiu.
Estão com manchas na pele. Ficam tristes de repente. Mas não estão caducos: caducos ficam os filhos, que relutam em aceitar o ciclo da vida.
É complicado aceitar que nossos heróis e rainhas já não estão no controle da situação. Estão frágeis e um pouco esquecidos, têm este direito, mas seguimos exigindo deles a energia de uma usina. Não admitimos suas fraquezas, seu desânimo. Ficamos irritados se eles se atrapalham com o celular e ainda temos a cara-de-pau de corrigi-los quando usam expressões em desuso: calça de brim? frege? auto de praça?
Em vez de aceitarmos com serenidade o fato de que as pessoas adotam um ritmo mais lento com o passar dos anos, simplesmente ficamos irritados por eles terem traído nossa confiança, a confiança de que seriam indestrutíveis como os super-heróis.
Provocamos discussões inúteis e os enervamos com nossa insistência para que tudo siga como sempre foi. Essa nossa intolerância só pode ser medo. Medo de perdê-los, e medo de perdermos a nós mesmos, medo de também deixarmos de ser lúcidos e joviais. É uma enrascada essa tal de passagem do tempo. Nos ensinam a tirar proveito de cada etapa da vida, mas é difícil aceitar as etapas dos outros, ainda mais quando os outros são papai e mamãe, nossos alicerces, aqueles para quem sempre pedíamos voltar.
E que agora estão dando sinais de que um dia irão partir sem nós.
                      
                     (Martha Medeiros)

A origem do Tchê,,,,


Há quem goze de nosso uso do termo “TCHÊ”, ache até chulo-grosseiro este linguajar. Se soubessem a sua origem, aí abaixo relatada, talvez mudassem sua opinião....

Sotaques e regionalismos na hora de falar são conhecidos desde os tempos de Jesus. Todos na casa do sumo sacerdote reconheceram Pedro como discípulo de Jesus pelo seu jeito "Galileu" de se expressar.

No Brasil também existem muitos regionalismos. Quem já não ouviu um gaúcho dizer: "Barbaridade, Tchê"? Ou de modo mais abreviado "bah, Tchê"?
Essa expressão, própria dos irmãos do sul, tem um significado muito curioso.
Para conhecê-lo, é preciso falar um pouquinho do espanhol, dos quais os gaúchos herdaram seu "Tchê".
Há muitos anos, antes da descoberta do Brasil, o latim marcava acentuada presença nas línguas européias como o francês, espanhol e o português. Além disso o fervor religioso era muito grande entre a população mais simples.
Por essa razão, a linguagem falada no dia, era dominada por expressões religiosas como: "vá com Deus", "queira Deus que isso aconteça", "juro pelo céu que estou falando a verdade" e assim por diante.
Uma forma comum das pessoas se referirem a outra era usando interjeições também religiosas como: "Ô criatura de Deus, por que você fez isso"? Ou "menino do céu, onde você pensa que vai"? Muita gente especialmente no interior ainda fala desse jeito.
Os espanhóis preferiam abreviar algumas dessas interjeições e, ao invés de exclamar "gente do céu", falavam apenas Che! (se lê Tchê) que era uma abreviatura da palavra caelestis (se lê tchelestis) e significa do céu. Eles usavam essa expressão para expressar espanto, admiração, susto. Era talvez uma forma de apelar a Deus na hora do sufoco. Mas também serviam dela para chamar pessoas ou animais.
Com a descoberta da América, os espanhóis trouxeram essa expressão para as colônias latino-americanas. Aí os Gaúchos, que eram vizinhos dos argentinos e uruguaios acabaram importando para a sua forma de falar.
Portanto exclamar "Tchê" ao se referir a alguém significa considerá-lo alguém "do céu". Que bom seria se todos nos tratássemos assim. Considerando uns aos outros como gente do céu.
Um abraço, Tchê!


domingo, 25 de agosto de 2013

A missão...


Ser mãe de uma criança especial me faz ouvir algumas vezes a seguinte frase: você é uma pessoa especial, pois só pessoas especiais recebem esta missão. Esta afirmação com intuito carinhoso e estimulador, sempre me causa desconforto, pois eu bem sei que nunca me preparei para esta tarefa, e ainda hoje não me sinto desenvolta e dona da situação. Me pego muitas vezes impaciente e irritada com o trabalho que um filho com necessidades especiais requer.
Os dias são agitados, com uma agenda apertada de escola e atividades extra-classe. As refeições devem ser planejadas de acordo com o hábito e o paladar de meu filho, na rua a atenção é constante, com os veículos, o abrir e o fechar de portões, os cães; e mesmo em locais fechados há as escadas rolantes, as portas de elevadores e tudo que nos cerca e que a maioria de nós, mães, só se dá conta e vê como ameaça por uns dois anos, enquanto as crianças são ainda consideradas bebês. Mas para mim esta cautela já dura sete anos e não há prazo para acabar.
E as noites mal dormidas que afligem as mães de recém-nascidos? Ah! Eu me lembro de quando me acalentava a idéia de que meu filho cresceria e dormiria sozinho, por muitas horas e de que eu, então, teria que brigar para tirá-lo da cama no horário de ir para a aula. Que sonho bom! Ainda espero este dia, por enquanto ele só ocorre em períodos de doença. As noites insones são corriqueiras, e quando há a felicidade de um sono ininterrupto de oito horas, durmo em estado de vigília, como se a qualquer momento o sonho acabe.
Os dias sem atividades planejadas se arrastam e as horas de sono voam. As conquistas são pequenas gotas em um oceano de desafios. Os dias passam um após o outro, as crianças voam em seus aprendizados, experts nas novas tecnologias, algumas com vasto vocabulário, e meu filho voa pelo mundo na sua hiperatividade, mas caminha a passos vagarosos no que diz respeito ao aprendizado. 
Que ser especial sou eu? Sou somente uma mãe tentando fazer o meu melhor, proporcionando as vivências necessárias ao desenvolvimento de meu menino, e retribuindo o amor que ele se esforça tanto para me expressar. Minha missão é não desanimar, mas eu não fui eleita por possuir as qualidades necessárias, mas terei que me desapegar de atributos indesejáveis, como a inveja, a covardia e a revolta, e assim, talvez, me tornar uma pessoa melhor, especial.


(Silvia Sperling)
                                                                                       

sábado, 24 de agosto de 2013

Cães Ativista...



No calçadão de Santa Maria sempre se encontram alguns
cães que são cuidados pelos frequentadores do local e moradores da proximidade.
Entre eles, dois vira-latas
ficaram conhecidos pela reiterada participação nas
frequentes manifestações populares.
Tem-se a informação
de que são irmãos e estão sempre juntos.
O “Gurizinho”, de
pelagem amarela, ficou famoso especialmente na ocupação
dos manifestantes no prédio da Câmara de Vereadores da
cidade, na metade deste ano de 2013.
Esse cãozinho
permaneceu junto aos ocupantes durante os seis dias de
luta. Sua imagem, enrolado na Bandeira Nacional ou muito à
vontade sobre as faixas de protesto , dominaram a rede
social.
Já o “Preto”, seu companheiro de luta, apareceu em
fotografias junto ao plenário.
Porém esse não foi o único
acontecimento político que os dois participaram. São
assíduos acompanhantes de passeatas, como a
“Marcha das Vadias",
as manifestações na luta pelas passagens urbanas
e, em especial nos frequentes protestos pela justiça dos
familiares das vítimas da Boate Kiss.
Esses cães hoje são um
verdadeiro símbolo santamariense em prol da mobilização
social.
Ao mesmo tempo, representam a liberdade e a
solidariedade, pois, quando não têm compromissos dessa
ordem, estão perfeitamente integrados à paisagem local:
no agitado calçadão da Rua Dr. Bozano ou junto à praça central.
Nesses locais sabem que sempre estão protegidos,
com alimentação e abrigo garantido por várias pessoas, em
especial cuidadores anônimos que reconhecem e retribuem a
solidariedade amiga que eles provaram que também emana
dos coraçõezinhos caninos.

(Bernadete Santos)