sábado, 15 de novembro de 2014

Tropa de Elite...



As mulheres demonstram o amor entre si de um modo óbvio. Elas se abraçam, andam de

mãos dadas, oferecem colo, acariciam os cabelos, sem conotação sexual.

Amigas confessam seus cuidados sem meio-termo. Há o toque, o aconchego, o abraço longo e apertado.Elas se aninham e se embalam no reencontro mais banal. São catárticas, choram, não medem as palavras de ternura.

Celebram a cumplicidade: dançam juntas, realizam mímicas, cobram juras, dividem drinques, emprestam cartões de crédito. Já os homens entre si são toscos. Quando se amam dentro da amizade, não se comunicam diretamente. Não descarregam declarações. 

Eles se escondem na timidez, receiam o vexame, tensos e reprimidos. O cumprimento é gritado e rouco, o abraço é quase um empurrão. E ainda por cima é bem possível receber uma saraivada de socos nas costas. Meninos crescidos que continuam a trocar esbarrões e safanões para justificar o contato físico. Amizade masculina é desidratada, árida.

Amizade masculina é corredor polonês, é xingão, é cascudo, é luta livre. O reconhecimento de importância é feito mais pela piada do que pelo elogio. A saudade é fundamentada pela grosseria. Não espere carícias e prefácios. O hábito é falar mal para dizer que se gosta. 

– Seu otário, onde você andou que não responde a minhas ligações?
Nada é suave, linear, carinhoso. 

Homem não entra no armário nem para trocar de roupa. Eles se sentem culpados por amar um outro homem e disfarçam. Têm medo de que alguém entenda errado, que interprete como atração. Há um código militar do aceno e do diálogo lacônico. O que prepondera é o uivo, o urro, a reclamação por trás das frases emocionais. Quem vê de fora pensa que são inimigos, são desafetos, são rivais. 

– Idiota, não consegue nem assar uma carne, jamais alguma 
mulher lhe dará pelota. 

Até a solidariedade vem suja, misturada de agressão. 

– Esse panaca não tem conserto!

Amor para os amigos é ofendido, formado de insultos, preconceitos e espinhos. É uma admiração truculenta, bélica, num idioma renhido, criado em estádios de futebol, em churrascos, em bebedeiras. Como se o pior fosse o melhor, como se o contrário traduzisse o certo, como se o avesso significasse a transparência. 

Para consagrar um eu te amo é preciso atravessar  um purgatório de impropérios. E o engraçado é que o “Eu te amo” não é entregue ao interessado, é usado na terceira pessoa para se diferenciar da cantada. Aparece dentro de um contexto, não numa conversa a sós. É, na verdade, uma apresentação para uma plateia real ou imaginária. 

– Eu amo esse babaca!

Homem mesmo só elogia, de maneira pura, a si mesmo. Sabe que não terá ninguém mais para fazer esse trabalho.


Fabrício Carpinejar

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