família. Ouviria mais as músicas de que gosta. Enfim, não desperdiçaria o tempo com besteiras. Você provavelmente leu isso com um brilho nos olhos, mas imaginando que ninguém consegue viver tão intensamente. Engano seu.
A publicitária Mara Gabrilli, por exemplo, vive exatamente assim: intensamente. Para ela, não há nada mais maravilhoso do que estar vivo. "As pessoas nem se dão conta de que deveriam valorizar o lado bom da vida. Parecem esquecer que só se vive uma vez." Detalhe: Mara é tetraplégica. Adquiriu a deficiência há dez anos, em um grave acidente de carro. Mas a tragédia mudou sua maneira de enxergar a própria vida. Aproximou-se da família e decidiu ajudar os outros. Hoje dedica-se a sua ONG, a PPP (Projeto Próximo Passo), que auxilia e pesquisa curas para deficientes físicos. Há muitas pessoas como Mara, que passaram por um trauma e souberam dar a volta por cima. Mais: descobriram o valor que têm suas vidas. Para descobrir o valor da vida, não é preciso passar por nenhuma tragédia. Basta estar vivo.
A força de um trauma
Segundo especialistas, um trauma é um evento fora do comum, que causa emoções tão fortes que a maioria das pessoas não consegue, pelo menos em um primeiro momento, tolerar o que aconteceu. O que caracteriza o trauma é a emoção que ele causa. "O choque é tamanho que perdemos nossas defesas comuns, saímos do eixo", afirma o psicanalista e psiquiatra José Otavio Fagundes, da Sociedade Brasileira de Psicanálise.
A ciência ainda não consegue prever como alguém vai se comportar diante de um fato terrível. Mas pelo menos uma coisa se sabe: quem lida melhor com frustrações do cotidiano enfrenta melhor as situações extremas.
Após anos de experiência como diretora do Departamento de Psiquiatria do Hospital do Câncer, a psiquiatra Maria Teresa Lourenço constatou que os pacientes que saem em menor tempo do trauma da doença são exatamente os que aceitam melhor os obstáculos. Muitos deles, inclusive, ao saber do câncer, vão em busca de antigos sonhos, como se tivessem tomado uma injeção de ânimo. "Os mais inflexíveis, no entanto, levam o dobro para encontrar soluções. E padecem o triplo", afirma Maria Teresa.
Quase morte
Experiências de quase-morte servem como uma chacoalhada, um susto. "É como se a vida estivesse te dando uma segunda chance", afirma a psicóloga Rita Pugliese, do Programa Menor Risco, do Hospital do Rim e Hipertensão de São Paulo, que ajuda enfartados a se recuperar e modificar os hábitos.
Em um exame de rotina, o ator Herson Capri descobriu que tinha câncer no pulmão. O tumor estava muito próximo da pleura, a membrana que envolve o órgão, e ele teve de ser operado às pressas. "Compreendi que não sou tão poderoso como imaginava. Foi um amadurecimento muito duro, mas essencial." Após o susto, ele parou de dar importância a problemas menores, aprendeu a não se levar tanto a sério e, principalmente, a aproveitar cada instante que passa ao lado de quem ama. A maior lição que o ator aprendeu é a de que todos nós já estamos no lucro, pelo simples fato de estarmos vivos. Antes tarde do que nunca.
Faça por você
Você deve estar se perguntando neste exato momento como é possível alcançar esse estado de espírito sem passar por um grande trauma.
Um bom passo para começar a viver mais "vivamente" é acordar para o fato de que enfrentamos pequenos traumas, pequenas mortes todos os dias, a toda hora: a sobremesa divina acaba, a noite deliciosa termina, o expediente chega ao fim, a dor de cabeça passa. Como dizem os budistas: nada dura. Nem sua vida. As pequenas mudanças que atravessam seu caminho são lembretes constantes disso.
Quem viu o fim logo ali, tão perto, sabe que o futuro não existe. Sonhos, vontades, desejos só podem ser realizados e satisfeitos no presente. Deixar para depois aquilo que se quer é correr o risco de não fazer. É agora que você comemora o prazer de viver.
Erika Salum
Erika Salum
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