No último domingo, a escritora Martha Medeiros lembrou de como nos sentimos separados da natureza. Um pensamento legado desde a Grécia Antiga, que teve seu apogeu com Descartes. Um fenômeno bem descrito na obra O Homem e o Mundo Natural, de Keith Thomas. O historiador de Oxford mostrou como o homem se relacionou com as plantas e os animais ao longo da história
Então, aproveitando os tempos de clamor por pluralidade, nada mais coerente que olhemos as coisas através de múltiplos olhares. Assim, proponho uma reflexão a propósito da Expointer, considerada a maior feira agropecuária da América Latina. Quando é comum que sejam exaltados números recordes e bilhões de reais em negócios. Neste cenário, não há dúvida de que esse setor é um dos alicerces da nossa economia, uma visão da qual poucos discordam. Todavia, corremos o risco de reforçar um forte paradigma, que muitos se dedicam em romper, de que somos superiores e temos o direito de explorar a natureza.
Convém salientar que, atualmente, grande parte da criação animal é baseada em métodos industriais. Logo, a visão bucólica dos animais no campo foi dando lugar ao confinamento e ao manejo intensivo. A lógica da produtividade, da maior eficiência associada à tecnologia, avançou pelo campo com a ideia de progresso. Neste contexto, os animais tornaram-se produtos. As suas necessidades se resumiram àquelas suficientes para maximizar o lucro. Assim, prevaleceu a máxima do menor custo e do maior ganho no menor tempo. O que as pessoas não sabem é que o rápido ganho de peso, a eficiência da nutrição e da genética são comemorados à custa do sofrimento animal, do surgimento de novas doenças e da poluição ambiental.
Nesta época, é comum que levemos nossas crianças ao parque para ver e interagir com os animais. Assim, acabamos por reforçar a ideia de que os animais são objetos descartáveis e não seres sencientes. A esta altura, algum leitor poderá afirmar que isto é conversa de ambientalista ou protetor de animais, mas lembro, como ressaltou Sir Thomas, que o homem aplicou a si mesmo a lógica da dominação, da domesticação e da exploração animal.
Portanto, faço votos que, ao visitar a feira, estejamos acompanhados do sentimento de empatia por aqueles seres que estão ali privados da vida que a natureza lhes reservou.
Renato Silvano Pulz
Professor de bem-estar animal